domingo, 31 de outubro de 2010

Família - Final

MARIANA



Depois que Stephanie saiu tomei um grande gole de café e me senti pronta para o trabalho, pedi a ajuda do capitão Chandler para nos auxiliar e me levar até a sala de segurança. A caminho da sala olhei para Peter que estava ansioso já em estado de nervos.
- Bem Peter. Vamos ter que nos virar, mas a notícia boa é que seu filho vai nascer em um dos hotéis mais luxuosos de New York. – tentei acalmar seu nervosismo.
- E como vai fazer isso, Doutora? – Perguntou Peter quando chegamos à sala.
- Você vai ficar aqui fora da sala, sentado esperando notícias, enquanto eu vou lá com minha equipe e faremos todo o possível e te garanto, pela situação, faremos até o impossível para tirar sua esposa e filha daquele elevador. – Assim que terminei Peter se sentou em uma cadeira e permaneceu ali, enquanto todos entravam na sala.
- O que vamos fazer Doutora?
- Um parto, Victoria! – juro que a ouvi expressando um “Yes!”.
- Dra. Bottino – Disse o capitão bonitão dos bombeiros – Não disse nada na frente do marido da sua paciente, mas os cabos do elevador estão comprometidos, ele só está seguro por um cabo de segurança e as travas laterais. Qualquer deslize e o elevador pode despencar a qualquer momento.
Vi a apreensão estampada no rosto de Mark e Victoria.
- E as portas do elevador estão travadas e isso está dificultando a ação imediata. Mas vamos separar as portas e tirá-las de lá o quanto antes. – Continuou o capitão.
- Ok ! – Disse Mark – Você abre as portas e a gente faz o nosso trabalho.
- Não vai ser tão fácil. Nós não temos tempo, o bebê precisa nascer. E pelo o que o capitão disse pode ser que demore mais que Anabelle agüenta segurar.
Fui direto para o monitor, onde um funcionário do hotel acompanhava tudo no elevador. Em uma tela central dava para ver Anabelle deitada no chão, com a bolsa sob a cabeça e uma moça segurando a mão dela. Não dava pra ver o rosto da tal moça, mas parecia que falava algo, pois Anabelle respondia mexendo a cabeça.
- Tem algum modo de falar com quem está no elevador? – Perguntei ao funcionário que monitorava as TVs.
- Pode falar assim que ela atender ao telefone. – Ele me passou o aparelho que tinha acabado de discar.

- Oi – A Moça se levantou e disse em uma voz arfante.
- Olá, eu sou a médica da Anabelle e vou precisar muito da sua ajuda.
- É só dizer o que preciso fazer.
- Muito bem, nós... – Vi que não sabia seu nome – Como você se chama?
- Helen.
- Bem Helen; vou ser sincera com você, a coisa aqui fora está feia...
- O quê...?
- Não! E em hipótese alguma pode deixar Anabelle perceber – Cortei sua fala – Quero essa ela o mais relaxada possível, e se apavorar não vai ajudar muito.
- Um pouco difícil Dra.
- O que estão dizendo? – Ouvi a voz fraca de Anabelle ao fundo – Quem é?
- Sua médica, Anne – Helen respondeu numa voz tão calma que convenceu a qualquer um – pode falar, Dra.
- Os bombeiros estão fazendo o possível para serrar as portas do terceiro e do quarto andar e tem gente tentando concertar o gerador.
- Ótimo!
- Só que pelo que consigo avaliar, Anabelle não poderá esperar mais. Helen, eu conto com você pra me ajudar.
- Certo, farei meu possível. – A vi olhar de uma forma tão doce e ao mesmo tempo tão convicta pra Anabelle, que estava quieta demais pro meu gosto.
- Muito bem, Helen, você terá que ver para mim com quantos centímetros de dilatação ela está.
- Mas como eu faço isso? – Perguntou ela meio desconfiada.
- Com o tato.
- Ah não, Doutora, eu não vou fazer isso! – Respondeu assustada.
- Fazer o quê? – perguntou Anabelle no fundo da linha.
- Mas você prometeu ajudar, Helen.
- Não fazendo um parto! Eu nunca fiz isso antes. – Ela se virou e olhou bem pra câmera no teto do elevador e sussurrou pra mim.
- Você não está sozinha, já fiz isso muitas vezes e você vai ter que me ajudar nessa.
- Doutora, eu não posso.
- Helen, não me decepciona, eu preciso de você! Tem um pai desesperado aqui fora e uma equipe de bombeiros me dizendo que este elevador corre o risco de cair e temos que tirar vocês daí, mas Anabelle não poderá sair antes de dar a luz. Então me ajuda, por favor, e eu prometo te levar pra casa na moto amarela.
Ela olhou interrogativamente pra câmera e eu continuei:
- Vai vizinha gata, por mim.
- Não sei se vou conseguir. – Helen disse sorrindo.
- Vai sim, tente tudo bem?
- Está certo! – Confirmou balançando a cabeça.
- Então vai lá e mede pra mim.
- Como?
- Vê quantos dedos consegue colocar.
Helen deixou o telefone pendurado e foi até Anabelle. Dava pra ouvir a respiração dela controlando a dor. Vi ela dizendo algo que não consegui ouvir e colocar a mão por debaixo do vestido de Anabelle, logo em seguida voltou ao telefone.
- Três, mas... – Nessa hora o grito de Anabelle encobriu o que Helen havia dito e ela voltou correndo pra perto dela. Meus internos estavam com os olhos pregados no monitor, nunca os vi tão calados e concentrados. Era só um parto.
- Ahhh! – Ouvi as duas gritarem no elevador.
- O que aconteceu? – Perguntei, mas Helen não ouvia, estava com Anabelle, falava com ela. Mas logo pegou o telefone.
- O que aconteceu, Helen?
- Essa merda desceu um pouco.
- Tudo bem, passou, nós vamos tirar vocês daí.
- Manda ela colocar no viva voz – Disse o funcionário de Hotel. – O botão azul.
- Ok! Helen, coloca no viva-voz, botão azul. – Ela apertou o botão e foi para junto de Anabelle.
-Oi, Anabelle!
- Doutora, me ajude, por favor.
- Anne, está tudo bem, nós vamos ajudar, tem um monte de bombeiros aqui fora fazendo de tudo para tirar vocês daí. Anne, as contrações como estão? Se lembra dos pré-natais?
- Perdi a conta quando já estavam com menos de um minuto. – Ela respondia chorando.
- Helen, a dilatação. Pode verificar de novo?
Ela pediu licença a Anabelle e mais uma vez sua mão desapareceu embaixo do vestido. Nesta hora Peter entrou na sala e resolvi não tirá-lo de lá, afinal ele estaria ao lado de Anabelle se o parto fosse em condições normais.
- O que ela está fazendo? – Ele perguntou olhando no monitor.
- Medindo a dilatação – Disse Mark – Ela terá que fazer o parto.
- E ela sabe como?
- Não, mas vou ajudá-la. – Respondi – E se quer mesmo ficar aqui, melhor ficar calado.
- Amor! – Anabelle falou num suspiro. Dava pra ver que estava chegando a hora, ela respirava pesadamente e mal conseguia falar.
- Oi, meu bem. – Peter disse no tom mais doce que já ouvi na vida. – Estou aqui, ok. Pode ficar tranqüila que os bombeiros estão serrando as portas e tem toda uma equipe de médicos aqui.
- Isso mesmo. – Conclui – E vai ser rápido. Helen?
- Minha mão é pequena, acho que dá pra passar ela inteira, mas não vou tentar isso.
- Anabelle preciso que você faça força.
- Amor. Estou ai do seu lado, segurando sua mão.
– Disse Peter tentando ajudar.

Anabelle começou a fazer força e nada, Helen disse que dava pra sentir a cabeça do bebê.
- Doutora, não é a cabeça – Disse Victoria – Só pode ser o cordão umbilical.
- Doutora. Estão me informando que conseguiram abrir a porta do quarto andar e vão descer por uma corda. – Informou o funcionário do Hotel.
- Não, diga que eu estou indo pra lá, ela precisa de um médico agora.
- Ok – Ele começou a falar no telefone.
- Helen, Anabelle, não façam nada por enquanto, acho que o bebê ficou preso no cordão umbilical. Eu chego ai em um minuto.
Disse isso e sai correndo da sala, com um equipamento esterilizado em mãos, e pedi que Mark e Victoria continuassem orientando as duas no elevador para qualquer eventualidade. Cheguei no quarto andar num piscar de olhos. Os bombeiros me amarraram com luvas e tudo mais para não sujar as mãos que precisavam estar limpas quando chegasse lá em baixo.
Graças ao rapel, desci pelo elevador sem muita dificuldade e me orientaram para tirar o tampão do elevador. Quando entrei no elevador Anabelle gritava e novamente fazia força, com meus internos a orientando pelo telefone. Me abaixei e comecei a preparar os equipamentos e colocar luvas para poder fazer meu trabalho.
- Anne, Vai dar tudo certo. E daqui a algum tempo poderá contar a seu bebê como foi a extraordinária historia de como ele veio ao mundo.
Aproveitei o momento que ela relaxou e pedi para Helen torcer o cordão umbilical com cuidado para tirá-lo do pescoço do bebê, quando quase imediatamente o bebê pulou para fora da bolsa e segurei- o com uma toalha limpa que trouxe na maleta. O chorinho dominava todo o lugar e dava pra ouvir as pessoas na sala de segurança aplaudindo. Assim, mais um bebê veio ao mundo pelas minhas mãos e pela primeira vez da Helen também. Logo depois, pedi auxilio de Helen para limpa-lo e cortar o cordão, limpamos tudo e preparamos Anabelle para sair dali.
- Anabelle, parabéns, é uma menina. – Anabelle não queria saber o sexo do bebê antes do parto então, ficou muito surpresa com a notícia, coloquei a criança no seu colo enrolada na toalha que tinha trago.
Não havia percebido o elevador se mexer, mas as portas já estavam abertas e estávamos no saguão do Hotel, com os bombeiros e meus internos cuidando de tudo para levar mãe e filha para o Hospital e alguns fotógrafos tirando fotos para as manchetes no jornal. Pela primeira vez naquele dia tumultuado olhei para Helen e sorri.

- Bom trabalho, vizinha.
- Eu não sei o que dizer. – Ela sorria também e lágrimas de felicidade saiam dos seus olhos.
- Tenho que ir até o hospital, você deve vir também para ver se precisa de alguma coisa.
- Estou bem. Minha mãe está me esperando no quarto, deve estar se perguntando por que estou demorando.
- Você foi incrível hoje.
- Fica me devendo uma carona.
- Tudo bem, acertamos depois. – sai correndo para fora do hospital e entrei na ambulância com a certeza de ter tido mais um ótimo dia de trabalho.
No hospital nos certificamos que estava tudo bem com mãe e filha, que teve que ser posta na incubadora, já que nascera prematura. Depois de ajeitada toda a situação uma enfermeira me informou que a irmã de Thomas estava no hospital com um tumor no cérebro, mal acreditei no que acabei de ouvir, então sai correndo para ver com meus próprios olhos. No meio do caminho Angélica me ligou dizendo que estava indo pra casa. Apesar de ter chegado ao hospital mais cedo do que esperava, não poderia ir pra casa curtir minha namorada com toda aquela situação com Thomas.
- Angie, eu já estava indo pra casa, mas ocorreu um problema.
- Mari eu sei, Karen e Jake chegaram aqui em casa com uma criança. – Angélica falava séria demais para a situação.
- Angie, você não está indo embora cedo demais? Amanhã ainda é domingo. – Perguntei esperando que ela não dissesse o que eu já estava esperando.
- Mari, eu só não posso mais viver com tudo isso, você com o hospital, você e seus amigo e nunca um espaço suficiente para mim.
- Ok, Angélica, por favor, não faça isso, eu sei que me comprometo demais, mas...
- Mari, não tem mais, precisamos dar um tempo.
- Angie. – Ela desligou o telefone com um beijo e se foi, assim simplesmente. Como se o tempo que vivêssemos fosse um nada. Estava ali parada em um corredor de hospital, esperando um despertar para poder crer no que acabara de ouvir.
Entretanto não podia ficar desse jeito, decidi deixá-los de lado. Não podia sofrer agora que Thomas precisava mais da minha ajuda. Continuei andando para vê-lo, tentando não pensar em Angélica.


*****

THOMAS

Depois daquele momento de nostalgia fraternal entre mim e Diana, ela cochilou em meus braços. Algum tempo depois meu amigo Clark me chamou à porta do quarto, me levantei devagar para não acordá-la e sai fechando a porta para poder conversar com o ele.
- Muito bem, Clark. O que tem pra me falar? – Perguntei apreensivo.
- Meu amigo, as notícias não são muito boas. O tumor está em um estágio muito complicado e localizado em uma região de difícil acesso, qualquer cirurgia nesse momento ela poderia morrer.
- Mas dá pra fazer a cirurgia? – Olhei para Clark desesperado, ele me olhou por um momento em silêncio.
- Thomas, ariscar é difícil, mas...
- O que estou perguntando é se dá pra fazer a cirurgia, Clark.
- Tom, ele não vai poder te responder essa pergunta. – Melinda chegou por trás de Clark.
- Veja Tom, eu não posso fazer uma cirurgia sabendo que é a sua irmã que está em um estado terminal vai está em cima daquela mesa e você esperando que ela saia de lá bem, eu não vou ser responsável, ou melhor, o irresponsável que matou sua irmã.
- Mas, Clark, Diana é minha única irmã, ela sempre fez de tudo por mim. Eu não posso simplesmente deixá-la assim sem uma chance. – Comecei a me alterar com Clark ali mesmo no corredor.
- Tudo bem Thomas! Nós vamos conversar com sua irmã de manhã, falar sobre suas possibilidades e se ela decidir pela cirurgia terá a cirurgia. – Clark me deu as costas e começou a andar.

- Clark! Ela pode não ter até amanhã! Clark! – Me sentei em uma cadeira no corredor e quando parecia não ter mais lágrimas, elas começaram a rolar pelo meu rosto – Ela tem um filho. – Sussurrei por fim.
- Tom. – Não tinha percebido que Melinda ainda estava no corredor – Entendo sua luta, entendo que queira ver sua irmã bem, mas o bem para ela agora não é sofrer em um hospital, tentar uma cirurgia que poderá matá-la.
Assim que Melinda terminou de falar escutamos o alarme vindo da sala de Diana, corremos para vê-la. Diana estava convulsionando em cima da cama, já tinha visto uma cena parecida antes, mas nunca imaginaria minha irmã naquele estado, o choque foi tão intenso que eu travei assim que abri a porta do quarto. Melinda me chamava para ajudá-la, mas não conseguia me mover, logo em seguida Clark chegou para auxiliá-la.
- Thomas, Tom, você está bem? – Mariana me chamava quando abri os olhos, estava em outra sala, minha cabeça pesava muito e ainda sentia uma náusea estranha. - Mari, o que você está fazendo aqui?
- Bem, já amanheceu, passei a noite na pediatria com uma paciente. Melinda já me contou o que aconteceu. Diana, que barra hein.
- Nem me fale, não estou mais suportando Mari. Isso tudo parece um pesadelo.
- Mas não é Tom, essa é a vida real e você tem que encarar isso tudo de frente. Eu sei que é a Diana, mas tenta pelo menos uma vez não ser o herói do dia e escute o que ela tem a dizer, tenho certeza que ela não está aqui apenas para lhe entregar o Cody e morrer. – Mariana era um doce de pessoa que a primeira vista me pareceu a pessoa mais frágil do mundo, mas me enganei quando nos conhecemos, ela era uma das pessoas mais fortes que já conheci – Thomas, você é um cara calmo, respeitável, todos nós te procuramos quando queremos algum conselho ou alguma ajuda, Agora é a nossa vez de tentar te ajudar, só abre espaço.
Mariana chegou para o lado e percebi que todos meus amigos, que toda minha família estava ali tentando me apoiar, Andy trouxera Cody e Jake também tinha vindo com Karen que até a manhã do dia anterior não sabiam de nada que estava acontecendo. Nossa, parecia que tinha passado anos nas ultimas horas. Fui até o banheiro, joguei uma água no rosto e me aprontei para poder ir conversar com Diana, que soube também de todos os fatos da ultima noite, que eu tinha desmaiado depois de travar diante da sua convulsão.
- Thomas! O meu Deus, você está bem. – Diana parecia preocupada com meu estado.
- Estou bem Di, mas queremos conversar sobre o seu estado.
- Eu tomei uma decisão, Tom.
- Diana, seu caso é muito delicado, por que não deixamos Tom terminar de falar. – Interveio Clark.
- Não. Eu quero a cirurgia. Se vocês podem fazer eu aceito que façam, o risco de morte é apenas uma das possibilidades. Há uma coisa maior pela qual eu preciso lutar.
- Seu filho? – Concluiu Clark.
- Não, minha família. – Todos no quarto olharam ainda mais fixamente para ver sobre o que Diana estava falando – Eu sei que se não estiver aqui, vou fazer alguma falta, mas ela será superada; eu sei que se não fizer a cirurgia, eu posso ter algumas semanas para aproveitar minha família, eu sei disso tudo. Entretanto, se eu não tentar fazer com que eu possa ter um longo tempo para poder aproveitar ainda mais este grupo de pessoas que me amam, eu não chegarei feliz onde quer que exista além desse mundo. Sendo assim, Dr. Clark, eu quero a cirurgia.
- Bom, se é assim certificarei que tudo ocorra o melhor e mais rápido possível.
- Obrigado, Dr.

Clark saiu da sala junto com Melinda, que deu um abraço em Thomas de boa sorte. E todos saíram aos poucos até restarem apenas eu e Diana. Ela parecia ter certeza da decisão que tomou, então não quis questioná-la. Me conformei com o que aconteceu e não por que ela escolheu minha opção, que era a cirurgia e sim por que não fazia mais sentindo correr, já que de todas as decisões a ultima palavra tinha que ser um desejo de Diana e não meu, do Clark ou de qualquer outra pessoa.
- Diana, obrigado por tentar.
- Tom, só me prometa cuidar do Cody?
- Não precisa nem pedir, Diana.
- Não, só me prometa, tudo bem?
- Está certo, eu te prometo cuidar do Cody como se fosse meu próprio filho, mas acho que é mais fácil aquele garoto cumprir a promessa dele de cuidar de mim em vez do contrário.
- Eu sei, ele é bem genioso. Mas por dentro daquele homenzinho de cinco anos tem uma criança Tom, que precisa de cuidados, embora não pareça a idade que tem.
- Exatamente, quem diria que ele tem apenas cinco anos. – Rimos da conversa para nos distrair um pouco.
Depois que conversei com Diana, deixei Cody passar um tempo com ela até os enfermeiros chegarem para os pré-operatórios, o dia seria muito agitado e não era um local para crianças, então pedi novamente para Andy levá-lo para casa. Cody veio até mim e disse que eu não poderia ficar sozinho e que preferia ir com Jake e Karen para casa, para Andy poder ficar comigo. Todos riram da maneira de Cody falar, mas aceitamos sua proposta.
Já tinha passado algumas horas desde que a cirurgia começou e Andy permaneceu o tempo todo ao meu lado me reconfortando. Não conseguia ficar sem me preocupar, entretanto Andy manteve o autocontrole durante todo o tempo. Não tinha fome nem sede e por algumas vezes não queria conversar. Como não fazia nada além de me preocupar, Andy me levou até minha sala e trancou a porta.
- O que você está fazendo, Andy?
- Bem, eu sei que não quer falar, até agora. Não quer comer, nem beber nada. Mas eu sei de alguma coisa, mesmo sendo inapropriada para o momento, que a gente pode fazer para você parar de se preocupar um pouquinho. Agora é você que precisa de cuidados.
Andy se aproximou e me deu um beijo, que não pude me conter, não conseguia pensar em mais nada. Comecei a arrancar nossas roupas e a beijar Andy com uma intensidade descomunal, deitamos na mesa do escritório e nem percebemos quando jogamos tudo que estava em cima no chão. Estava impressionado comigo mesmo com o sexo que estava tendo com Andy, depois de toda aquela tensão, Andy percebeu que tinha que me descarregar e resolveu o problema com o melhor sexo que fizemos em nossa vida.
Entretanto, depois de todo aquele amor me senti arrependido do que fizemos, enquanto Diana estava em uma mesa cirúrgica agarrada a sua ultima esperança de vida.
- Andy, isso não foi errado? - Disse enquanto o acariciava, estávamos deitados no chão do consultório com apenas um lençol de alguma maca nos cobrindo.
- Tom, o que há de errado no amor? Tudo bem que tem toda uma situação lá fora, mas aqui somos só eu e você. E você estava precisando relaxar um pouco. Pode ter sido errado, mas quem é que pode nos julgar por tentar acalmar a tempestade em um momento de fúria?
- Você deve estar certo. Mesmo sendo errado valeu a pena, estar aqui com você, como se o meu mundo fosse em seus braços. – Andy e eu nos abraçamos e ficamos ali por um bom tempo, até que pudessem notar nossa ausência.
Saímos da sala tendo a certeza de que estava tudo no seu lugar. Voltamos para o corredor do lado de fora da ala das salas de operação. Pouco tempo depois Melinda saiu da sala dando a notícia de que tudo corria bem até o momento e que Diana permanecia Instável, quando meu telefone tocou.
- Karen? Está tudo bem ai? – Perguntei apreensivo.
- Não Tom, Cody começou a falar que a Diana não está bem, mas todos vamos ficar bem. – Karen parecia aflita.
- Como é? Coloca ele na linha, por favor. – Esperei um segundo – Cody, Cody, está me ouvindo, o que aconteceu meu bem?

- Tio, mamãe não está bem, ela não vai melhorar, você precisa se acalmar, nós vamos ficar bem, não precisa ter medo. – Cody falava freneticamente, mas me parecia calmo ao telefone.
- Karen, como isso aconteceu? – Perguntei quando ele devolveu o telefone para Karen.
- Não sei, a um segundo atrás ele estava dormindo e acordou falando desse jeito. Thomas, ele disse que um anjo falou com ele.
- Meu Deus, Obrigado Karen, eu te ligo mais tarde.
- Melinda, entra lá dentro e vê o que está acontecendo, por favor? Depois que Melinda entrou na sala contei tudo que Karen me falou ao telefone, ele não acreditou no que estava ouvindo. E comecei a achar que Melinda estava demorando demais para voltar com notícias.
- Calma Tom; ela pode estar ajudando na cirurgia, vai correr tudo bem você vai ver.
- Desculpa Andy; não dá. – Olhei para ele com um olhar que não queria nunca que ele visse em mim.
- Você está com remorso. Thomas, não foi minha intenção, eu...
- Não, não é isso, Andy. Eu posso estar com remorso, mas não de você, não do nosso amor e eu não quero descontar em você. É só toda aquela tensão voltando. Me desculpa.
- Tudo bem.
Melinda voltou. Algum tempo depois, olhou Andy e logo para mim. Não precisou expressar nenhuma palavra, eu já sabia, porém não queria acreditar. Melinda tentou explicar as complicações que tiveram na cirurgia, entretanto não ouvia, não ouvia mais nada, apenas gritava e chorava como se o mundo tivesse aberto um buraco onde eu cairia se não fosse o abraço de Andy para me segurar no chão.


O primeiro sentimento da morte é a rejeição, não podia acreditar que aquela manhã tinha conversado com Diana e agora era impossível crer que ela não estava mais aqui, como se ela tivesse pulado uma janela na sala de cirurgia, como fazia quando criança para fugir de casa. Depois vem o sentimento de que poderíamos ter feito alguma coisa, que tudo aquilo poderia ser diferente da realidade na qual não conseguimos aceitar. Não conseguimos aceitar pelo menos até passar toda a raiva, a revolta da perda daquela pessoa que fez a diferença em nossas vidas. Então caímos na perda e na saudade, no sentimento que nos faz lembrar os atos da pessoa amada, no que ela fez de bom, nos momentos de alegria e felicidade até percebermos que aceitamos a sua passagem nas vidas das pessoas que deixou. Mas até a aceitação, temos certeza de um longe caminho pela frente.

*****

Família - Parte 1

“A verdadeira família é aquela
unida pelo espírito e não pelo sangue.”
Luiz Gasparetto


Se olharmos no dicionário, família é um conjunto de descendentes e afins de uma linhagem, grupo de pessoas que vivem ou não em comum. Portanto, seus amigos, aquelas pessoas que importam na sua vida, fazem parte de você mesmo sendo notável a diferença ou a convivência, devem ser colocadas no seu dicionário, mesmo sendo ligados aos laços de sangue, ou não. Mas às vezes, os laços de sangue prevalecem.

*****



O outono seguia seu caminho natural, as folhas secas continuavam caindo e deixando a paisagem um pouco mais bela. Assim como nossas vidas corridas onde enfrentamos mil obstáculos por dia; mas que ao final do dia, depois de um longo percurso, nos compensava apenas sentar envolta a lareira ao redor de laços tão profundos quanto uma família podia possuir, onde havia uma conversa aconchegante, gargalhadas descontraídas e o silêncio que declarava o amor que cada membro daquela “família” possuía uns pelos outros.




THOMAS

Calor, alegria, frio, tristeza, cada sentimento sendo devorado dentro de mim por aquele sonho perturbador. Uma criança chorando nos braços de um homem, aquela cena me apertava o coração, sentia calafrios e suava ao mesmo tempo, quando acordei com o barulho do telefone, do meu Pager e do despertador, tudo ao mesmo tempo. Eu estava enrolado debaixo do edredom suando frio. Pulei da cama e atendi ao telefone.
- Diana? É você. – Diana era minha irmã mais nova, não a via desde quando ela se mudou com seu filho Cody pro Canadá, ela estava atrás do pai de Cody, mas agora parece que lembrou quem é sua família. Não pelos motivos que pensei.


*****

- Bom dia, Andy! Vou ter que correr hoje e quero você comigo no hospital – Consultei o relógio – daqui à uma hora, pode ser?
- O-K! O que houve hoje que está nessa correria? Algo importante?
- Diana está aqui.
- Quem é Diana? – perguntou Karen saindo da cozinha com uma jarra de suco de laranja, provavelmente terminando de ajudar Andy a por a mesa do café.
- A Diana está aqui? – Jake gritou saindo do banheiro com a boca cheia de espuma do creme dental.
- Diana é a irmã do Thomas, Karen – respondeu Andy com cautela – Tudo bem, Thomas; Diana está aqui e creio que pelo tom da sua voz não é pelo motivo que eu penso, certo?
- Certo Andy. Mas acho melhor não falar isso agora. Estarei te esperando no hospital, tudo bem?
Sai de casa com um alvoroço atrás de respostas a perguntas que não estava com cabeça pra responder naquele momento. Desci as escadas com um pouco de pressa, com a cabeça um turbilhão pensei em reclamar com o sindico mais tarde o concerto do elevador. Nos últimos degraus, arrumando alguns papéis na minha pasta, trombo em uma garota e meus papeis vão todos pro ar.
- Será que todo mundo tromba em mim nessas escadas?
- Ok, me desculpa. Helen é você?
- Thomas! Desculpa falar assim, é que ontem à noite trombei com a Mariana nas escadas também.
- Ah, então você já conheceu a Mari? – rimos da situação. - Mas ah, da próxima vez tento olhar por onde ando beleza?
- Não serio, não foi nada. Eu também ando atrasada, tenho que ir ao Plaza visitar minha mãe.
- Sua mãe, que bacana.
- Acredite, nem tanto! – Ela riu.
- Certo, então... Até mais. – continuei caminhando à portaria.
- Até, manda lembranças ao Andy por mim.
- É mais provável você vê-lo antes de mim então, mande as minhas. – Respondi ao longe brincando com Helen.
O transito aquela manhã estava um caos, cheguei à estação um pouco atrasado e mais preocupado do que ansioso de ver Diana novamente. Ela era minha única irmã, sentia sua falta e a do meu sobrinho que mal convivi, mas se o que me disse ao telefone era verdade, toda situação seria delicada demais, estava com medo das conseqüências, como se algo em meu intimo me dissesse que havia alguma coisa ruim, ou que podia ficar ruim, e nessas horas que gosto de estar com Andy ao meu lado.


No saguão da estação vi que o trem também estava atrasado, o que me deixou um pouco mais incomodado, a ponto de perguntar a um cara do serviço de passagens o momento que o trem chegaria à estação. Finalmente, depois de uma longa espera, Diana aparece no portão de desembarque com um garotinho de aproximadamente cinco anos com um cabelo de tigela e duas malas enormes logo atrás deles, aparentemente Diana estava bem, o que me deixou um pouco menos preocupado e me permitiu matar as saudades da minha irmãzinha.
- Diana, eu... Pensei... Oh meu Deus, que saudades – Caí nos braços dela apertando-os bem forte até dar conta da situação – Ai Diana me desculpe, eu não...
- Thomas, é bom te ver também. E não precisa me tratar como se estivesse convalescida ou doente demais para um abraço.
- Tudo bem. E esse homenzinho aqui, como está grande, cara!
- Oi tio Tom, mamãe disse que nós vamos conhecer o hospital do senhor? – Cody disse com a cara mais inocente do mundo. Olhei para Diana, sorri e respondi ao garoto.
- É isso ai garotão, vamos conhecer o hospital do tio – peguei Cody nas costas e fomos para o carro.
Saímos da estação em direção ao hospital, no caminho aproveitei pra matar a saudades de Diana e conhecer mais sobre meu pequeno sobrinho. O trânsito continuava horrível, então demorei o dobro do tempo que levei para chegar à estação. Chegando ao hospital e encontrando com Andy aproveitei para levar Cody ao restaurante e deixá-lo com ele, pois tinha que conversar sério com Diana.



*****



“Paciência e perseverança têm o efeito mágico de fazer
as dificuldades desaparecerem
e os obstáculos sumirem.”
John Quincy Adams


MARIANA

Não é o telefone! Não é o telefone! Não é o telefone! – Repeti pra mim mesma ao ouvir aquele toque insistente. Parecia que eu tinha acabado de me deitar.
- Mari, é o telefone, atende. Por favor!
- Alô!
- Dra. Bottino? – Era voz de homem, tentei me concentrar ainda com sono.
- Doutora é o Mark, estamos em uma emergência, verifique seu Pager. – Olhei para meu “bip” e vi uns dez chamados de emergência com uma paciente grávida.
- Ok, Mark, estou indo encontrá-los, me atualize da situação.
- Estamos no hotel Plaza, ocorreu um acidente que provocou uma pane elétrica em todo quarteirão, a sua paciente Anabelle está presa em um dos elevadores do hotel em trabalho de parto.
- Oh meu Deus! Tudo bem, Mark, chego ai em alguns minutos.
Só podia ser brincadeira, era sábado de manhã, planejava ter um pouco de folga já que minha namorada veio só para passar o fim de semana comigo.
- Criança mais intrometida essa! – Pensei em voz alta enquanto corria pelo quarto.
- Quem é intrometida? – Perguntou Angélica.
- Uma das minhas grávidas entrou em trabalho de parto. E está presa no elevador do Plaza.
- Plaza? O Hotel Plaza? – Disse ela chocada.
- Bem vinda ao meu trabalho! – Tentei fazer uma piada – É sério amor, eu tenho que ir até lá.
- Ah, que chato. – Ela reclamou com uma voz chorosa – Queria tanto ficar com você hoje.
- Eu também, meu bem. Mas tenho que ir. Tchau! – Corri até a cama e lhe dei um beijo na testa.
Passei apressada pela sala e lá estavam todos os meus amigos espalhados com pratos à mão.
- Oi gente – Cumprimentei todos olhando em volta, mas não para eles e sim procurando algo.
- Está a fim de almoçar? – Perguntou Karen – Jake e eu cozinhamos.
- Não, eu tenho que sair. Tem uma paciente grávida presa no elevador do Plaza e adivinhem só quem é a médica sortuda?
- Grávida?
- No Plaza?
- Elevador? - Todos ficaram abismados.
- Está em cima da geladeira. – Respondeu Andy ainda de boca aberta, adivinhando o que eu procurava.
- Como sabia que eu estava procurando o capacete...?
- E não reclama que nós sabemos que você ama o que faz. – interveio Jake.
Apenas sorri para eles, corri para a cozinha e bati a porta dos fundos em seguida.
Realmente, era a pura verdade, pois amava o que fazia. A coisa mais emocionante do mundo, ouvir o primeiro chorinho, o primeiro suspiro da vida de um bebê que você ajudou a vir ao mundo. Só não saia dizendo isso por ai, meus amigos são boa gente, mas tinha que manter minha reputação de durona. Mas todos eles, bem, na verdade todos nós, temos esse jeito de saber das coisas uns dos outros sem precisar dizer nada, era meio como nosso jeito família de ser.
O elevador ainda não estava concertado, “alguém tinha que reclamar com o sindico”, assim segui pelas escadas até o estacionamento e saí a toda velocidade no transito caótico de Nova York. Não tinha idéia de que horas eram, mas parecia que os milhões de habitantes e turistas da cidade haviam saído de casa nesta hora e concentrado todos no West Side. E tudo o que eu pedia era cama, estava exausta, mas sou uma cirurgia preste a entrar em serviço, então tinha que me agüentar ao máximo.


*****


Anabelle é uma das minhas pacientes e tenho a tarefa de seguir sua gestação e ensinar aos meus internos do St. Patrick Hospital, ela vem apresentando um quadro que nos fez acompanhá-la com mais cuidados. Até o ocorrido. É sua primeira gravidez e o bebê pelo visto se impacientou, pois ela só completaria oito meses de gestação dali a duas semanas. Anabelle e o marido, Peter, estão reformando a casa para a chegada da criança e como a gravidez apresentava riscos ela preferiu se hospedar em um hotel próximo, já que não aguentava o “clima” de um hospital.
Mal entrei pela porta do hotel e Peter veio correndo em minha direção.
- Doutora, você têm que tirar ela daquele elevador.
- Fica calmo, Peter – Procurei minha equipe naquela montoeira de gente.
Era impossível ficar calmo com toda aquela bagunça em volta dele. Hóspedes curiosos, bombeiros por todo lado, além dos funcionários do hotel que tentavam acalmar todos.
- Ei, Bottino, aqui! – ouvi alguém me chamar.
Nem precisava olhar para saber a quem pertencia a voz. Andei na direção de uma morena escandalosa de linda, minha atendente chefe Stephanie, que vivia jogando piadinhas pra mim. Várias vezes eu me peguei em pensamentos indecentes com ela, mas tinha meu trabalho e meu profissionalismo
- Bom dia, pessoal! Qual é a situação? – Me dirigi a ela e aos dois internos que se encontravam ali.
- Boa tarde, Dra! – Eles Responderam rindo e eu dei um gole no café que um deles segurava.
- Bem, nossa paciente e outra moça ficaram presas no elevador, entre o quarto e terceiro andar. A Sra. Werner perdeu um pouco de sangue e suas contrações estão em um intervalo de 3 minutos. – Relatou Victoria, uma interna muito inteligente de lindos, longos e encaracolados cabelos pretos. Por isso os outros internos a chamavam de Yang, pela semelhança com a Cristina de Grey’s Anatomy.
- Onde vocês estão se comunicando com eles?
- Pelas câmeras da sala da segurança, conseguimos falar com ELAS pelo telefone do elevador. – Respondeu Mark, um dos mais brilhantes internos que já tive, ele realmente tinha potencial.
- Obrigada, Mark. Muito bem, removê-la de lá no estado que ela se encontra está fora de cogitação – enfatizei – E quero-a deitada o tempo todo.
- É o que também achamos – Surgiu uma voz masculina atrás de mim, um homem alto de farda, Chandler, li o nome em seu uniforme. – Meu pessoal está fazendo o máximo para abrir as portas do elevador com segurança. O gerador do hotel estava em manutenção quando ocorreu a pane que foi ocasionada devido a um acidente aqui perto com alguns veículos que acabaram batendo em um poste.
- A coisa está bem feia lá, Mariana. – Stephanie concluiu as palavras de Chandler – E eu vou ter que ir pra lá, já fui “bipada” algumas vezes, só estava esperando você chegar para cuidar da Anabelle.
- Obrigada, Stephanie. Você vai precisar dos...?
- Não – Ela respondeu antes que eu terminasse – Seus internos aprenderão mais aqui, já temos uma equipe no local e tem uma ambulância para a sua disponibilidade do lado de fora.
- Tudo bem, Obrigada de novo.
- Boa Sorte.
- Você também.


*****



THOMAS


- O que você quer fazer? – Comecei a gritar com Diana.
- O que você acha que eu devo fazer Thomas? Eu já fiz todos os exames possíveis, nenhum médico se quer cogitou a possibilidade de operação. Eu já me conformei, por isso trouxe o Cody, pra você ficar com a guarda dele.
- Não! Nenhum médico cogitou a possibilidade de operação por que nenhum médico tinha uma irmã, nenhum deles “cogitou” a possibilidade de perdê-la, pra sempre.
- Todos esses anos e você não se preocupou com a gente.
- Por que você sempre disse que estava bem, eu sempre soube que não, mas tinha a certeza de que você me procuraria quando cedesse ao orgulho e parasse de procurar aquele homem. Só não esperava que me procurasse nessas condições – Diana caiu em meus ombros em pratos.
- Tom, eu estou com medo.
- Calma Diana, eu só não quero te perder, não assim, não se podemos lutar até o fim. Por favor, faça novos exames, por mim, pelo seu filho.
Diana concordou com novos exames, mas pelas tomografias que ela me mostrou eu sabia que o problema era maior que esperávamos, entretanto eu precisava crer, precisava lutar por aquela pessoa que era parte da minha vida, que era minha família. Assim, apresentei Diana ao time de Neurologia do St. Patrick, com certeza por ela ser minha irmã não me deixariam operá-la, mas com sorte poderia auxiliar nas decisões.
- Diana, esse é o Dr. Clark, ele trabalha como atendente junto comigo no hospital e essa a Dr. Melinda, eles vão te acompanhar para os exames.
- Tom, você não vêm?
- Eu tenho que falar com o Andy, encontro vocês depois pra ver os resultados.
- Tudo bem Sra. Cohen, por aqui, vamos cuidar muito bem da irmã do Dr. Thomas – Disse Melinda.
- Pode ir Diana, tudo vai ficar bem. – Abracei minha irmã segurando para ela não perceber o choro.
Enquanto ela virava o corredor entrei no elevador, que por sorte estava vazio, e cai em lágrimas, não suportava aquilo, eu não era o forte da família, Diana sempre me ajudava nas horas que precisava, acho que me acostumei demais em ter uma irmã mais velha que nunca parei pra pensar que também tinha que ser forte como eu estava sendo, por enquanto.
Desci até o restaurante procurando por Andy, ele estava no hall de entrada do lado de fora do restaurante, Cody estava brincando com algumas crianças que estavam com seus familiares aguardando noticias dos pacientes. Quando vi meu sobrinho brincando alegre com outras crianças, tão distante dos fatos que estavam acontecendo, comecei a chorar novamente. Andy percebeu minha presença e quando viu meu estado veio até mim e me apertou bem forte em um abraço.
- Tom, me conta o que está acontecendo, eu não posso ficar aqui nulo sem saber por que você está sofrendo. – Andy disse acariciando meus cabelos.
- Cody não pode me ver assim, eu tenho que me recompor.
- Tudo bem, vamos deixar ele na pediatria por alguns minutos até você me contar tudo, ele pode ficar brincando com as crianças lá, tudo bem?
- Ok, Andy, eu... Eu não sei o que faria da minha vida sem você.
- Tom, eu te amo e estou aqui pra enfrentar tudo por você e com você.
- Obrigado, Andy. – Ele me deu um beijo, quando percebemos que estávamos no hall de entrada e no lugar do meu trabalho e paramos, ele pegou Cody e levou à pediatria enquanto o esperava no consultório da neurologia.

*****
- Tumor? – perguntou Andy tentando entender.
- E bem complexo, já está em um estágio bem avançado e em um local muito difícil de operar.
- Mas é operável não é? – Andy olhou fundo nos meus olhos que tentava desviar – Tom não é?!
- Não é tão simples, Andy. Diana consultou muitos médicos, mas era orgulhosa demais pra vir até mim enquanto o tumor estava menor. Ela se conformou com todos os médicos dizendo que era inoperável, que não quis mais tentar.
- Meu Deus! Então ela só veio aqui para deixar o Cody com você, estou certo? – Andy estava abismado, porém sabia manter o controle melhor do que eu.
- Foi isso que ela me disse, mas ela resolveu fazer novos exames, eu estou aguardando para ver os resultados.
- Está certo. Vou ficar com Cody então, levá-lo pra casa, tudo bem?
- Andy, você me faz esse favor? As malas dele e da Diana estão no carro. Só vou levá-lo para se despedir da mãe.
- Tudo bem, Tom – Andy me abraçou novamente, um abraço aconchegante como se dissesse que ele estava ali pra tudo que eu precisasse.
- Andy! – Ele já estava saindo da sala, quando fechei a porta e em um impulso o beijei com toda intensidade possível, como se estivesse passando para ele todo o amor que sentia por aquele cara lindo que estava sempre ao meu lado, enquanto ele retribuía meu ato de amor, me abraçava e acariciava minha nuca.
- Tom, não importa o que aconteça, eu sempre vou te amar, eu sempre vou estar ao seu lado, eu sempre vou cuidar de você. – e completando com mais um beijo ardente, Andy saiu da sala me deixando com uma aura de amor e esperança, pois agora eu sabia que mesmo se eu cair sempre terei o nosso amor para me apoiar e poder levantar novamente.

*****

Ainda meio desnorteado cheguei à pediatria, peguei Cody e o levei para o quarto da mãe. Enquanto brincava com as crianças Cody simplesmente parecia um garoto normal, que não tinha nenhuma noção dos acontecimentos. Entretanto, essa aparência mudou assim que o peguei no colo a caminho do quarto, agora ele estava calado, com a cara triste e não sabia o que fazer com meu sobrinho. Aquilo me deixou mais triste e aturdido. Chegamos ao quarto e Diana estava deitada na cama já com a roupa do hospital.

- Mãe! – Cody correu dos meus braços e foi abraçar Diana.
- Oi meu querido, tudo bem? Você se divertiu? – Perguntou Diana tentando disfarçar um animo.
- Sim, o tio Andy me levou na sala com crianças e eu brinquei com elas. – Cody respondeu com a voz mais inocente do mundo.
- Que lindo, meu amor.
- Mas, Mãe?
- O que foi Cody?
- Você e o tio Tom não estão felizes, já está na hora de você ir embora morar no céu? – As palavras de Cody atingiram Thomas em seu peito, que ele não agüentou segurar as lágrimas. Diana também não conseguia segurar enquanto Cody apenas os observava.
- Mãe. Eu disse algo que não devia?
- Não, meu querido, você não disse nada, a mamãe e o tio Tom que são uns bobões. – Diana secou as lágrimas do seu rosto e continuou – Cody se lembra da conversa que a mamãe teve com você?
- Do bichinho mal que está na sua cabeça?
- Isso, do bichinho mal. – Disse Diana numa voz doce - Escuta Cody, os médicos amigos do tio vão tentar tirar o bichinho mal da cabeça da mamãe, mas...
- Diana, não...! – tentei intervir para Diana não pensar no pior ou ainda contar ao Cody sobre isso.
- Tom, ele é meu filho, tem que saber.
- Mãe, eu sei o que acontece. Eu não quero ficar sem você, mas se você não estiver, o tio Tom vai precisa de mim.
- Eu sei meu amor. – Diana era forte e tentava ao máximo segurar as lágrimas que escorriam aos poucos enquanto ela falava – Eu só quero dizer que se a mamãe não voltar pra casa você não precisa ficar triste, por que tem um monte de gente que te ama e que vai cuidar de você até você crescer, viver bastante pra encontrar com a mamãe de novo, tudo bem?
- Mãe, não precisa ficar triste, eu vou ficar bem e você tem que ficar bem também. – Diana apertou Cody bastante e lhe deu um beijo no rosto – Agora vai, o tio Andy esta te esperando pra te levar pra casa.
- OK. Te amo, mãe – Cody também abraçou Diana, lhe deu um beijo no rosto e fez um sinal de cruz na testa de dela, que mexeu com meus sentidos que ainda observava tudo do outro lado da cama.
Assim que Cody saiu da sala eu abracei Diana e nós dois caímos no choro, todas aquelas palavras, aqueles simbolismos mexeram com a gente de tal forma que ficamos um bom tempo abraçados, até depois que o choro parou. Eu deitei ao lado de Diana e começamos do nada a conversar e relembrar situações da nossa vida e riamos como se nada, nem o tempo, os problemas, nem o mundo lá fora tivesse a mínima importância.

*****

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Helen

“... Eu não acredito em envelhecimento.
Eu acredito em alterar para sempre
o aspecto de alguém para a luz.
Eis meu otimismo.”
Virginia Woolf


Quando estava indo fechar a porta depois dos carregadores saírem eis que me surge um dos homens mais lindos que já vi na vida. Ele estava parado na porta do apartamento em frente, sorrindo calorosamente e a porta formando uma moldura da tela em que ele se formava.
- Nunca ti vi, mas acho que você é o homem da minha vida – Infelizmente disse a mim mesma, mesmo sabendo da extinta chance de ter aquele homem.
- Olá! – Ele me cumprimentou ainda com aquele sorriso.
- É... Oi! – Também sorri, claro, pelo menos tentei.
- Então você é a nova vizinha? – fechou a porta do seu apartamento e deu um passo para atravessar o corredor – Muito prazer, eu sou Andy. Andreas, mas todos me chamam de Andy.
- Oi Andy – Apertei gentilmente a mão que ele oferecia – Sou a nova vizinha sim. Muito prazer, Helen Martins, todos me chamam de Helen – Sorri novamente.
- Seja Bem vinda Helen. Eu vim pra ajudar com a mudança se você quiser.
- Não precisa se incomodar com...
- Não vai ser incomodo, estou com o dia livre e é sempre um prazer ajudar a vizinhança. – Andy Sorriu novamente, com certeza aquele sorriso abria caminhos – vamos por a mão na massa então?

*****

Começamos pelo quarto, que segundo Andy era o cômodo principal da casa, “É onde você passa a maior parte da sua vida, é o seu cantinho” – disse ele. Em pouco tempo Andy já tinha me conquistado, ele era um amor de pessoa... E lindo, porém era gay. Ele contou sobre sua vida, sobre seus amigos e seu namorado com os quais morava do lado, viramos amigos de infância.
Entre caixas de livros e equipamentos, Andy mostrou uma empolgação quando soube que eu era fotógrafa, mas nada comparado quando soube que também amava cozinhar.
- Então já fica me devendo um almoço na sua cozinha nova, que tal uma massa caseira?
- Com certeza – Respondi – Mas quero o senhor braços fortes me ajudando.
- Combinado, uma macarronada à quatro mãos – Andy completou rindo – Nossa, a Mari que vai adorar.
- A Médica?! – Pelo o que eu entendi o apartamento do Andy era uma bagunça de gente, tinha médicos, modelos, cantores. Mas parecia uma bagunça arrumada, gostosa de ver, uma pequena família sem convenções.
- Ela mesma. Seus pais são italianos.
- A convidamos então! – completei com um sorriso implícito.
Andy ficou me ajudando até o fim da tarde, depois teve que ir prometendo voltar na manhã seguinte se precisasse. Aproveitou a despedida e me convidou para vê-lo apresentar no abr onde toca, apenas agradeci e prometi ir outro dia, já que estava exausta.

*****
Coloquei meu último livro na estante, parei um tempo para admirá-la, o suficiente para perceber o mundo de caixas espalhadas pela minha nova sala. Por mais triste que eu estava quando entrei nesse apartamento, senti um alívio sentada naquele sofá. Paz, segurança... Destino, alguma coisa além dos nossos conhecimentos me dizia que a partir de hoje minha vida mudaria.
Então ri do nada.
- Não mesmo! – Levantei decidida.
Definitivamente não iria ficar arrumando minha mudança em uma noite de sexta como aquela, que tudo fique uma bagunça até amanhã. Tomei um banho, troquei-me, conferi o relógio e deixei minha nova casa no West Side.

Nasci no Brasil, mas pelo trabalho do meu pai, minha mãe e eu, viemos morar nos Estados Unidos quando eu ainda estava no colégio. Meu pai trabalhava na embaixada brasileira em Washington, na qual não entendia muito bem. Tive uma vida boa, mas difícil pela ausência do meu pai, que tentava suprir sua falta dando de tudo o que eu queria, embora não tenha buscado muitas coisas na vida. Nunca dói o tipo de garota que enlouquecia com um cartão de crédito ilimitado na mão, ganhei um de aniversário aos quinze anos.
Mas também não era hipócrita a ponto de dizer que não ter que me preocupar com dinheiro era ruim. Graças à posição do meu pai pude realizar um dos poucos sonhos que tenho na vida, viajar pra vários lugares e conhecer o mundo. Pude ver Madonna em uma de suas turnês pela Europa, a Torre Eiffel em Paris, conhecer as noites de Londres. Também estudei nas melhores colégios e não gostava de como as portas se abriam pra mim.
De tudo isso quem não gostava era minha mãe. Daria sua Mercedes para ter o papai em casa a tempo para o jantar. O casamento com o divorcio até que acabaram bem, há quatro anos, mas eles ainda se falam não só pela obrigação por terem me criado. Desde então vim estudar em Nova York, passei por algumas coisinhas chatas da vida, entretanto agora aqui no meu novo apartamento pretendo me consolidar como fotógrafa enquanto curto um dos outonos mais lindo do mundo, que já trazia boas promessas.

Segui pela Broadway, virei em uma esquina até que me dei conta de que estava no Soho, um dos bairros com melhores bares e restaurantes da cidade. Parei em frente a um bar que anunciava musica ao vivo, Midtown Coffee, MTC. Gostei do clima então resolvi entrar. Estacionei ao lado de uma bela moto amarela que fiquei namorando uns minutos antes entrar.

Ao colocar os pés naquele lugar já tinha gostado de cara. Parecia uma mega sala de estar, com um bar ao fundo, umas mesas de biliar ao lado e mesinhas envoltas a um pequeno palco de música ao vivo. Pessoas jogavam enquanto conversavam, outras apenas conversavam, o barman estava sempre sorrindo e jogando drinks para o ar. Observei atentamente o lugar para ver se reconhecia alguns amigos que comentavam muito do lugar, quando de repente alguém me venda os olhos com as mãos.
- Quem é? – perguntei já tateando as aquelas mãos para reconhecer a quem pertencia. – mãos de homem, acho eu.
A pessoa balançou afirmamente minha cabeça.
- Mãos levemente compridas e macias... e você é cheiroso hein, embora não reconheça o aroma.
As mãos abandonaram seu rosto, quase ao mesmo tempo em que me virei.
- Andy!
- Oi Helen! – Com o sorriso lindo. – Acho que já ouviu muito hoje, mas você está muito gata.
- Ah, bondade sua Andy – sorri também – É só um jeans e um suéter velho.
- Quero ficar tão bem quanto você em um suéter velho – nós rimos – Procurando alguém?
- Com um cara lindo desses ao meu lado? Não mesmo.
- Tudo bem, então vem, quero te apresentar ao ‘meu’ cara lindo.
Está bem, essa noite não dava pra ser melhor, Andy é uma ótima pessoa e estava me apaixonando por tudo logo de cara. Meu visinho, minha casa, o MTC, e agora Thomas, o ‘lindo’ do Andy, “E Que Lindo!”. Sentei-me com os dois e mais do que depressa Thomas me perguntou se podia pedir um bom drink da casa para mim, pela educação aceitei.
Em pouco tempo já tinha me enturmado e começamos a conversar sobre a vida, tudo bem que era mais uma entrevista sobre minha vida, pois eu só respondia. Mas de repente me pareceu ter visto alguém.
- Meninos, a conversa está ótima – não era totalmente mentira, não me sentia bem sendo “entrevistada”, mas em parte a conversa estava boa – Acho que acabo de ver um amigo entrando.
- Claro – Thomas concordou olhando para Andy fazer o mesmo.
- Mas vê se volta... logo – Andy concluiu entendendo depois pelo olhar de Thomas que era para darem espaço para Helen.
Meu amigo Jake parou no bar quando me viu caminhando até ele, nesse meio tempo fiquei pensando o quanto duas pessoas totalmente diferentes e novas na sua vida podem ser tudo o que você precisa. Não tinha conversado com os meninos mais do que duas horas, mesmo assim senti que eram boas pessoas, uma amores. Cumprimentei Jake rapidinho e disse que estava com uns novos amigos, e ele me disse o mesmo apontando para a mesa de Andy e Thomas. Poderia haver mais coincidências? Jake fazia parte da “Bagunça boa”, o nome que Andy se referiu aos amigos que moram em seu ‘apê’ com o Thomas.
Jake Sato é um belo exemplo da beleza oriental. Ele é modelo e trabalhamos inúmeras vezes para campanhas de revistas de moda para a qual já trabalhei. Jake é o tipo de pessoa que encanta, sorri com o corpo e espontaneamente. Sem falar que adoro aqueles olhinhos rasgados, é o que mais me chama atenção nele.
Passou um bom tempo e eu estava ali cercada de homens lindos me divertindo em uma sexta a noite, bem melhor que minha visão sentada no sofá, ri para mim mesma. Os meninos queriam jogar bilhar, mas recusei de primeira, por que eu nunca fui boa em jogos. Entretanto não adiantou muito, pois eles me fizeram jogar assim mesmo e pagar alguns micos básicos.

- Seus traidores! – Uma moça de lindos cabelos loiros disse rindo aos meninos – Só porque me atrasei no banho vocês me trocam? – completou brincando.
- Karen, que bom que chegou. Essa é a nossa nova vizinha – Respondeu Andy.
- Ah, oi – Karen já se aproximou sorrindo e me deu um beijo no rosto – A vizinha gata!
- Acho que... Obrigada! – Respondi sem jeito.
- Helen Martins – Jake me apresentou.
Karen foi outra super simpática comigo, e uma das que mais insistiu para que não fosse embora cedo, mas estava cansada e com muito custo fui para casa.
Mesmo indo embora cedo, adorei a noite e pensava nisso enquanto dirigia para casa. Não me divertia assim a muito tempo, ultimamente era só trabalho e mais trabalho, me fez bem sair um pouco e esquecer os problemas da vida, mesmo a vida preparando pra mim uma coisa nova ainda sem meus conhecimentos.
Estacionei na garagem do prédio e uma moto amarela como a do MTC estava ao lado da minha vaga, então decidi que como as coisas boas vêm em três eu iria comprar uma moto igual se visse novamente. Ri dos meus pensamentos. Até mesmo porque minhas finanças estavam em baixa, por conta da compra do apartamento novo.
- Ótimo! – Me disse quando vi uma placa de “com defeito” no elevador. Tive que subir as escadas, com a boa sorte de ver duas motos iguais, alcançava os degraus bufando.

Enquanto subia lembrei-me de ter que ligar para minha mãe e comecei a procurar o celular na bolsa, quando de repente sinto um vão e uma mão me segura antes que eu encontre com os degraus da escada. Uma maluca veio descendo as escadas e me deu uma trombada, ainda bem que me segurou antes de cair.
- Ai! – Foi a única coisa que consegui expressar com palavras.
- Foi Mal. Me desculpe. – Disse a ruiva.
- Ah, tudo bem, valeu por não me deixar rolar tudo o que tive que subir – Terminei rindo olhando a escada. Ela riu também, me disse que tinha bons reflexos, então. Nos despedimos e continuei subindo.
- Ei, espera. – Ela me chamou e veio subindo – Vou te acompanhar. Esqueci o meu capacete.
- Moto amarela? – Perguntei quando ela já tinha me alcançado.
- É sim.
- Linda.
- Obrigada. Mas, você é nova no prédio, não é? Nunca te vi por aqui.
- Sou sim. – Entramos as duas na porta do quarto andar – Acabei de me mudar.
- Ah, a vizinha gata? – me disse sorrindo.
- Conhece os meninos? – tentei esconder meu desjeito.
- Moro com ele – Ela disse abrindo a porta de casa – Seja bem vinda, hein.
- Obrigada. Até mais, hein – paramos as duas na porta,como se tentássemos ver quem desligava o telefone primeiro.
- Até então – Ela começou a entrar e balbuciou algo que me pareceu “hum... ela é gata mesmo”, e entrou rindo.
- Obrigada de novo. – ri um pouco – Você... você também é.... – tentado acabar com minha timidez com um pulo muito grande. Mas uma ruiva, cabelo abaixo dos ombros, brincos de argola, jeans e uma jaqueta preta por cima de uma blusa lilás, o que mais eu poderia “tentar” dizer?
- Sou a Mariana.
- Helen.
- Até mais então Helen. Tenho que correr ou o pessoal me mata. Sai correndo, por que tinha que resolver um probleminha.
- Sabia que tinha visto sua moto em algum lugar. Eu estava lá, eles estão implorando por você no bilhar. Eu fui um horror.

Ela sorriu.
- Agora vai, estou te prendendo aqui.
- Ok. Boa Noite. Mas por que não volta comigo?
- Não estou muito cansada, a mudança e tudo mais.
- Tudo bem. Boa noite então.
- Boa noite. – Fechei a porta e escancarei a boca, pelo que me pareceu o “elevador com defeito” foi a minha sorte e encontrar a dona da moto amarela seria a mesma coisa de ver uma, agora teria que comprar aquela moto. Ri daquela situação toda passando pela minha cabeça. Lembrei de novo de ter que ligar pra minha mãe.

Thomas



Andy ainda dormia ao meu lado e não queria incomodá-lo; dormia tão perfeitamente que um anjo não seria comparável. Essa era uma das razões pela qual me apaixonava por aquele cara todas as manhãs. Aproveitei seu sono para tomar um banho demorado e depois preparar o nosso café da manhã predileto, mas quem disse que a vida foi feita de imprevistos? Bom ele estava certo, percebi isso quando cheguei à cozinha e encontrei a mesa posta.
- Bom dia, Jake – Jake já estava terminando de fazer o café e começando a acabar com meus planos para aquela manhã.
- Bom dia, Thomas. Eu só queria tomar café antes de sair, então aproveitei meu bom humor para por o resto da mesa.
- Tudo bem cara, mas por que dessa disposição toda? Alguma paixão nova?
- Essa surpresa vocês só vão saber mais tarde – Jake disse olhando Andy entrar na sala.
- Eu ouvi Surpresa?
Um segundo depois rimos da situação. Andy praticamente pulou da cama quando ouviu Jake falar de surpresa que por sinal devia ser muito boa, pois fez Jake preparar o café da manhã. Ele simplesmente não se dava bem com a cozinha, mesmo sendo descendente de japoneses não herdou nem a arte da cozinha oriental, percebemos isso quando ele tentou preparar o jantar uma vez. Mas tudo bem ele é nosso melhor amigo.
- Bom dia primeiro não é Andreas?
- Ah... Bom dia Jake. Desculpa, eu não pude deixar de ouvi, então queria saber logo da surpresa. Bom dia Tom – Andy tentou se explicar se sentando à mesa, enquanto ainda riamos do ocorrido.
- Então Andy, como foi no MTC ontem à noite? – Jake perguntou entre uma torrada e outra.
- Nada mal. E o Joe perguntou se vamos aparecer para o Happy Hour de sexta.
- Realmente precisamos ir ao MTC, tem tempo que não apareço por lá – Jake era modelo fotográfico, tinha que freqüentar todos aqueles coquetéis badalados de Manhattan, que ele nos arrastava sempre que parecia chato demais pra ele se entediar sozinho.
- Ok. Vou pegar o plantão no hospital com a Mari no sábado, assim ficamos livres na sexta e vamos poder aproveitar o Happy Hour do Joe numa boa.
Mariana é a outra amiga que divide o duplex com Andy, Jake e eu, ela é residente do St. Patrick Hospital como obstetra enquanto eu trabalho no setor cirúrgico.
- E falando em Mari?- Perguntou Andy.
- Ela saiu cedo pro hospital, aquela ali só pensa em trabalho. – resmungou Jake se levantando da mesa. Mariana sempre foi sua parceira pra tudo, até quando ela terminou a faculdade e começou como interna no hospital e não parou mais para relaxar, a não ser por nossas sextas na qual geralmente vamos ao Midtown Cofee pra jogar conversa fora enquanto o Andy faz suas apresentações de voz e violão.
- Jake, termina de tomar o café pelo menos – Como esses eram um dos poucos momentos como uma ‘família’ fazia questão que todos terminassem suas refeições antes de saírem da mesa.
- Não posso, tenho um compromisso agora.
- Nossa Surpresa? – Jake se animou.
- Sim é isso, vocês verão quando eu voltar. Ah, Thomas, o porteiro informou que o apartamento do lado foi alugado e a mulher está de mudança hoje à tarde.
- Hum! Tudo bem, já me avisaram quando ela alugou o apartamento, quando tiver tudo certo nos passamos lá para desejar boas vindas.
- Ok! Tchau garotos.
- Tchau, Jake.
- Muito bem, como tem muito tempo que não ficamos a sós, hoje você vai ter que me compensar muito rapazinho – Jake disse entre risos – Afinal estamos sozinhos... Em casa... Sem ninguém – A Campainha tocou.
- Algo me diz que nossa romântica manhã a sós, não vai ser como nenhum de nós imaginou. – ri enquanto fui atender a porta vendo a expressão de menino emburrado que Andy adorava fazer para mim quando se sentia contrariado.
- Jake! – fiz uma cara imaginando que ele tinha esquecido as chaves de casa... De novo.
- Bem acho que a surpresa veio até nós – Jake anunciou dando um passo para o lado.
- Karen! – Andy correu quando ouviu o nome à porta.

*****

Karen é a mais nova da turma, mas não morava com a gente, ela era filha única de um grande dono de uma empresa internacional, não sabíamos muito bem o que ele fazia, mas foi em uma das viagens ao Brasil que conhecemos a Karen.
- Então Jake essa era sua surpresa? – Andy tentou fazer um tom irônico, sem sucesso.
- Eu também te amo, Mc Feeling – Karen pulou no colo do Andy pra dar um abraço – Ai gente, senti falta de vocês.
- Também sentimos saudades, mas você veio para ficar de vez não é? – Perguntei a Karen já intimando sua presença na ‘família’ - Já faz um bom tempo que esperamos que você viesse para morar conosco.
- Hum! Ainda não me decidi, vocês sabem que não me prendo em nenhum lugar. Mas algum tempo em NY e aqui com vocês vai me ajudar a decidir rapidinho.
- OK! Vou tomar minhas providências para ‘ajudar’ na sua escolha. – todos riram para descontrair.
- Tudo bem, tudo bem, mas depois de um fim de semana ao meu lado você vai simplesmente implorar para ficar com a gente – Jake também já estava planejando as baladas que iria levar a Karen para usar como argumento para ela ficar em NY.
Mesmo aquela manhã não sendo exatamente do jeito que eu havia imaginado e não ter sido nada do que o Andy esperava, foi exatamente perfeita pra todo mundo. Agora além da Mari e do Jake morando comigo e o Andy sempre ao meu lado, também tem a Karen, nossa Garota Sorriso. Nossa família agora estava crescendo.

Depois de ajudar a Karen com suas malas que sem exageros já parecia ser a mudança, passamos a outra parte da manhã caminhando no Central Park, como não podia faltar Karen fez do passeio a coisa mais divertida desde a última vez que a vemos. Ela era extrovertida e animada, e nos fazia relembrar a felicidade dos tempos de infância. Não faltava mais nada, tinha meus amigos comigo e o amor da minha vida do meu lado. Momentos raros onde temos que aproveitar o máximo, pois depois do almoço todos caíram na realidade.
- Andy, estão me chamando no hospital, vou ter que ir! – Disse a ele olhando o chamado no bip e lhe dando um beijo de despedia.
- Ok! Vai lá, eu aviso o pessoal que você teve uma emergência.

*****

Outono

“Não, Tempo, não zombarás de minhas mudanças!
As pirâmides que novamente construíste
Não me parecem novas, nem estranhas;
Apenas as mesmas com novas vestimentas.”
William Shakespeare




Já naquelas manhãs do começo de um novo outono via a brisa pela janela afugentar as folhas ressecadas pelo tempo no lado leste daquele parque onde de um sonho de menino se torna uma realidade que agora se formou meu lar. De manhã com um frio de cortar os olhos a ponto de descer lágrimas, que deslizava na pele nua do meu rosto acuando meu sono, quando olhei pra fora e tive a certeza de que o outono, a brisa e o frio cortante trariam novas mudanças na vida de todos em meu redor. Abri os olhos com o primeiro toque do novo despertador, que Andy comprou há umas semanas, e do sonho daquela noite restava o frio cortante que tão cedo já se via pelos vidros das grandes janelas arqueadas que iluminavam todo o quarto.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Central Park NY.....




"Nossa existência é transitória como as nuvens do outono. Observar o nascimento e a morte do ser é como olhar os movimentos da dança.
Uma vida é como o brilho de um relâmpago no céu. Levada pela torrente montanha abaixo"
Gautama Buda